Pela criação de um Colectivo Açoriano de Ecologistas que tenha por objectivo a reflexão-acção sobre os problemas ambientais, tendo presente que estes são problemas sociais e que a sua resolução não é uma simples questão de mudanças de comportamentos, mas sim uma questão de modelo de sociedade.
quinta-feira, 21 de outubro de 2010
O Cagarro tem dono?
Sempre tivemos dúvidas em participar em campanhas envolvendo trabalho voluntário quando as mesmas partem de instituições do Estado. Entre as várias razões possíveis, destacamos o facto de existirem por parte de algumas instituições, por vezes, objectivos ocultos, como:
1- Cooptação de instituições ou pessoas que autonomamente pretendem, de forma altruísta, prestar um serviço à comunidade;
2- Controlo das iniciativas com vista à sua inclusão nos seus relatórios de actividades, chamando a si todo o trabalho desenvolvido;
3- Poupança de dinheiro ao não admitir pessoal para os seus quadros ou ao não fazer contratações, ficando o mesmo disponível para fins de mera propaganda ou para o ceder a organizações “amigas” ou dos amigos;
Não vamos falar, muito, no fracasso, desde o início anunciado, da campanha “Eco-freguesias” já que a quantidade de lixos que temos visto na ilha de São Miguel não tem diminuído. As juntas de freguesia não têm sensibilidade ou capacidade para resolver o problema, as campanhas de sensibilização não surtem os efeitos desejados ou não são acompanhadas das medidas necessárias, como a distribuição de eco-pontos, a recolha eficiente dos mesmos, a não aposta na recolha porta-a-porta e a educação ambiental foi chão que já deu uvas. E mais do que tudo, a lógica que está por trás da política de resíduos está mais do que errada, com efeito a aposta continua a ser na produção e no consumo desenfreado pois em breve teremos a incineração que irá reduzir tudo a zero e irá produzir energia, mesmo que se tenha que forçar o aumento dos consumos ou desinvestir na eficiência energética e nas energias renováveis.
Em Outubro de 2008, surgiu, na ilha de São Miguel, o movimento cívico “Liga dos Amigos da Lagoa do Fogo”, que tinha como objectivo principal a recuperação e preservação daquele património natural da Ilha de São Miguel, e que iniciou as suas actividades, no dia 22 de Novembro, com uma acção simbólica de remoção de espécies exóticas invasoras.
Esperava-se que a SRAM apoiasse a iniciativa e a incentivasse, mas, ao invés, apenas destacou dois vigilantes da natureza (*) para fazer o acompanhamento da acção, não fossem os voluntários, entre os quais um doutorado em botânica, confundir endémicas com invasoras e tempos depois, adjudicou o trabalho de remoção das invasoras a uma associação que curiosamente tem como âmbito de actuação a salvaguarda do Património Ambiental, Histórico e Cultural da Zona Oriental do Concelho da Ribeira Grande (*).
Desconhecemos as razões a que levaram os aderentes da Liga dos Amigos da Lagoa do Fogo a desmobilizarem. Talvez o facto de verem que um dos objectivos da sua iniciativa voluntária foi atingido: o início, por parte das entidades oficiais, da remoção das plantas invasoras da Reserva Natural da Lagoa do Fogo.
A campanha que mais tinta tem feito correr é a do salvamento do cagarro que todos os anos ocorre nos meses de Outubro e Novembro. Pensamos que já estará esclarecida a origem da campanha SOS-cagarro, mas para os mais distraídos aqui fica uma pequena nota:
“a campanha SOS-cagarro foi criada em 1995 pelo Doutor Luís Monteiro, no âmbito do projecto LIFE “Conservação das comunidades de aves marinhas dos Açores”. O que a maioria das pessoas não sabe é que esta campanha surgiu no seguimento de outras duas, também da iniciativa do Doutor Luis Monteiro, que contaram com a colaboração activa dos Amigos dos Açores. Assim, em Março de 1993 foi lançada a campanha "Um espaço para os garajaus" e em Novembro do mesmo ano a campanha "A Escola e o Cagarro", no âmbito da qual foi aplicado um inquérito, sobre a espécie, destinado a alunos das escolas, nomeadamente do 1º e 2º ciclos do ensino básico e distribuídos 10 mil folhetos” (http://lutaecologica.blogspot.com/search/label/cagarro)
Esta campanha, quanto a nós, é a única que terá resultado, quer em termos de salvamento dos cagarros, quer no que diz respeito ao envolvimento de voluntários, os quais têm respondido positivamente quer aos apelos oficiais quer aos das ONGA dos Açores.
Face ao exposto, não se compreende a preocupação em saber quem colabora com quem ou quem recolhe um número maior de cagarros. Se o único objectivo é salvar cagarros, o único pensamento só pode ser como melhor organizar as brigadas nocturnas, tentar cobrir o máximo do território, difundir o mais profusamente possível o apelo e os cuidados a ter no salvamento da espécie e individualmente ou em grupo fazer o que estiver ao alcance de cada um.
O cagarro não tem dono!
T. Braga
Pico da Pedra, 19 de Outubro de 2010
(*) Nada temos contra os dois vigilantes da natureza nem contra a associação referida, enquanto uns estavam a fazer o seu trabalho a associação está a manter postos de trabalho.