sábado, 31 de março de 2018

Escavando na tauromaquia em São Miguel



Escavando na tauromaquia em São Miguel

A prática de torturar bovinos e cavalos é muito comum na ilha Terceira e tem-se mantido ao longo dos tempos não por ser uma tradição digna, mas porque é lucrativa para alguns. A sua sobrevivência só tem sido possível pelo apoio que recebe de políticos e governantes.

O farmacêutico natural da Lousã, que se estabeleceu em São Miguel, Francisco Maria Supico (1830-1911), na rubrica que manteve no jornal “A Persuasão” intitulada “Escavações” refere-se à realização de touradas na ilha de São Miguel, numa das muitas tentativas da indústria tauromáquica terceirense de espalhar o vício anacrónico de torturar animais ou assistir à tortura dos mesmos.

Numa notícia publicada no referido jornal, a 3 de julho de 1872, pode-se ler o seguinte: “Houve já duas corridas de touros, sendo a última, domingo. Quem nunca viu touradas não desgosta; quem as tem visto acha o divertimento abaixo de medíocre”.

A 17 de julho do mesmo ano, o jornalista depois de noticiar a realização de mais uma tourada, acrescenta que o dito divertimento “não promete sustentar-se, porque lhe faltam as condições essenciais: touros e toureiros”.

A 18 de setembro, no jornal referido, o redator pede “à autoridade competente para que não permita mais funções de touros, se não a pessoas competentes; porque, permitindo-se, acontece o que aconteceu no domingo último, que ia sendo fatal o divertimento”.

No 2º Volume das “Escavações”, Francisco Maria Supico faz uma síntese do abominável divertimento de ver sofrer animais nos seguintes termos:

“As touradas de 1872 deram-se num terreno da rua Formosa confinando com a rua da Alegria.

Para as de 1881 e 1882, armou-se praça em forma na rua da Mãe de Deus, quase em frente dado Negrão.

Gado e toureiros vieram da Terceira por conta de um empresário de lá, que não fez fortuna com a imperfeita exibição da arte tauromáquica.

Em S. Miguel dá-se o fenómeno de se não manter a braveza do gado indígena; e o que vem de fora amansa breve.

Não é por isso terra em que se possam ter grande apreço as bravias belezas do toureio.”

Hoje, a submissão dos principais partidos políticos ao capitalismo tauromáquico faz com que uma prática condenada em todo o mundo civilizado continue a fazer as suas vítimas, humanas ou não, nos Açores.

31 de março de 2018
Teófilo Braga

quarta-feira, 28 de março de 2018

Alguns marcos históricos da educação ambiental e da defesa do ambiente (5)



Alguns marcos históricos da educação ambiental e da defesa do ambiente (5)

Dando continuidade aos textos anteriores sobre o tema, hoje, damos a conhecer alguns marcos importantes, tanto internacionais como nacionais, relacionados com a defesa do ambiente e a educação ambiental que ocorreram entre 1974 e 1982.

Em 1975, por iniciativa da ONU e da UNESCO realiza-se, em Belgrado, um seminário internacional sobre educação ambiental no qual foi aprovada a Carta de Belgrado, um documento muito importante que ainda hoje devia ser alvo de reflexão. No seu texto, entre outros, encontra-se o seguinte alerta.

"Governos e formuladores de políticas podem ordenar mudanças e novas abordagens para o desenvolvimento, podem começar a melhorar as condições de convívio do mundo, mas tudo isso não passa de soluções de curto prazo, a menos que a juventude mundial receba um novo tipo de educação. Esta implicará um novo e produtivo relacionamento entre estudantes e professores, entre escolas e comunidades, e entre o sistema educacional e a sociedade em geral."

Em Portugal, em 1975, foi criada a Secretaria de Estado do Ambiente.

No dia 10 de julho de 1976, na cidade de Seveso, ocorreu uma explosão numa fábrica de produtos químicos, tendo havido a libertação dioxinas. Embora se pense que não terá havido mortes de humanos diretamente relacionadas com o ocorrido, 193 pessoas sofreram de váias doenças. Na altura morreram 3000 animais e outros 70 000 tiveram de ser abatidos para evitar a entrada da dioxina na cadeia alimentar.

Em Portugal a Constituição da República Portuguesa que entrou em vigor a 25 de abril de 1976 passou a reconhecer a todos os cidadãos o direito a um ambiente ecologicamente equilibrado e o dever de o defender (art. 66º).

Em 1977, realizou-se na cidade de Tbilisi (Georgia), antiga URSS a "Primeira Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental", na qual foram elaborados os princípios, as estratégias e as ações orientadoras em educação ambiental que ainda são adotados em todo o mundo.

Em 1979, foi assinada, em Berna, a Convenção sobre a Vida Selvagen e os Habitats Nauturais na Europa com os objetivos de conserver a flora e a fauna selvagens e os seus habitats naturais, em particular as espécies e habitats cuja conservação exija a cooperação de diversos estados, e promover essa cooperação.

A 28 de março de 1979, o núcleo do reactor de uma central nuclear em Three Miles Island, Estados Unidos, funde parcialmente devido a uma falha no sistema de refrigeração. É libertada radiação para o exterior e fortemente abalada a confiança dos cidadãos na energia nuclear. Dois milhões de pessoas foram atingidas pelas radiações e foram necessários 400 milhões de dólares para voltar a por em funcionamento o reator, o que ocorreu três anos depois.

No mesmo ano, 1979, realizou-se, em Genebra a I Cimeira Mundial do Clima, onde pela primeira vez foi reconhecido que as alterações climáticas são um problema grave para o planeta.

Em 1982, realiza-se a Conferência de Nairobi, para analisar o trabalho feito após dez anos da Conferência de Estocolmo. Preocupados com o estado do ambiente, os participantes acordaram na formação da Comissão Mundial do Ambiente e do Desenvolvimento (CMAD), chefiada por Gro Harland Brutland.

A 10 de dezembro de 1982, na Jamaica realizou-se a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar que estabeleceu os princípios gerais da exploração dos recursos naturais do mar e criou o Tribunal Internacional do Direito do Mar.

Em 1982, nos Açores, foi criado o Círculo de Amigos das Furnas, com o objetivo de defender os interesses, também ambientais, do Vale Formoso.

(continua)
Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31489, 28 de março de 2018, p.14)

domingo, 18 de março de 2018

Touros bons são os que matam mais



As torturas e a indiferença para com o sofrimento e animal são tradições enraizadas nalgumas mentes. Vejam o que escreveu A. de Castro Menezes: "Das touradas na Ilha Terceira são mais apeciadas aquelas em que a fama de braveza chegou a contra-se pelas colhidas e até pelas mortes que ocasionou". (Revista "Açores-Madeira", 10 de junho de 1950

quarta-feira, 7 de março de 2018

Alguns marcos históricos da educação ambiental e da defesa do ambiente (4)


Alguns marcos históricos da educação ambiental e da defesa do ambiente (4)

Hoje, publicamos o quarto texto dedicado a marcos importantes, tanto internacionais como nacionais, relacionados com a defesa do ambiente e a educação ambiental que ocorreram entre 1972 e 1974.

Com a presença de 114 países realizou-se, em 1972, em Estocolmo, a Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano. Nesta conferência foi criado o Programa das Nações Unidas para o Ambiente (PNUA), sediado em Nairobi, Quénia, e aprovada a Declaração do Ambiente que relativamente à educação refere o seguinte:

É essencial ministrar o ensino, em matérias de ambiente, à juventude assim como aos adultos, tendo em devida consideração os menos favorecidos, com o fim de criar as bases que permitam esclarecer a opinião pública e dar aos indivíduos, às empresas e às colectividades o sentido das suas responsabilidades no que respeita à protecção e melhoria do ambiente, em toda a sua dimensão humana.

John McCormick, num texto publicado no Rio de Janeiro intitulado “Rumo ao paraíso: a história do movimento ambientalista”, considerou que aquele evento foi “o acontecimento isolado que mais influiu na evolução do movimento ambientalista internacional” e acrescentou que “o pensamento progrediu das metas limitadas de proteção da natureza e conservação dos recursos naturais para a visão mais abrangente da má utilização da biosferapor parte dos humanos”.

No mesmo ano, a nível internacional, foi publicado o primeiro relatório do Clube de Roma que segundo Charles-Henri Favrod, “em vésperas da crise do petróleo que rebentará no ano seguinte, convida a opinião pública mundial, geralmente embalada por promessas expansionistas, a ganhar consciência dos «limites do crescimento». A sua repercussão imediata (45 000 leitores em França. 300 000 na Alemanha Federal, quase outros tantos nos Países Baixos) prova uma inquietação latente do público perante os «milagres económicos» e coloca em primeiro plano de atualidade um organismo até ali pouco conhecido”. Embora se possa considerar que o relatório foi alarmista, uma coisa é certa os “milagres económicos” têm acontecido à custa da delapidação de recursos não renováveis e a riqueza criada não tem chegado a todos os seres humanos, sobretudo aos seus principais criadores

A nível nacional foi criada a Subsecretaria de Estado do Ambiente, e apresentado na televisão o programa “Há só uma Terra”, da responsabilidade da Comissão Nacional do Ambiente.

Em 1973, o economista inglês Ernest Friedrich Schumacher (1911-1977) publica o livro “Small is Beautiful: um estudo de economia em que as pessoas também contam”, onde desenvolve o conceito de Tecnologia Intermédia e critica as economias ocidentais. No mesmo ano o engenheiro agrónomo francês René Dumont (1904-2001) publica o livro “Utopia ou Morte” que foi um marco importante no desenvolvimento do movimento da ecologia política que se opõe à “ideologia do crescimento ilimitado e à acumulação infindável de bens em que assenta a sociedade de consumo atual”.

A nível nacional, no ano de 1973, foi comemorado oficialmente, a 5 de junho, o Dia Mundial do Ambiente.

Em 1974, o químico dos EUA Sherwood Rowland (1927-2012) e o químico mexicano Mário Molina, nascido em 1943, descobrem que os clorofluorcarbonetos (CFCs) podem destruir a camada de ozono. No mesmo ano ocorre a primeira crise petrolífera. A Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) impõe um embargo do precioso líquido aos Estados Unidos pelo seu apoio a Israel na Guerra contra o Egipto e a Síria, catapultando os preços e originando uma crise energética e económica mundial.

Em Portugal com a implantação de um regime democrático a 25 de abril, foram criadas duas associações ligadas ao ambiente, o Movimento Ecológico Português, com sede em Lisboa, que foi dinamizado, entre outros, por Afonso Cautela e o Núcleo Português de Estudos e Proteção da Vida Selvagem, com sede no Porto.

Esta última organização tinha, de acordo com os seus estatutos, como objetivo prioritário a proteção da natureza, em especial da fauna e da flora, teve a sua sede localizada na rua Padre Manuel José Pires, localizada na freguesia de São Pedro, no concelho de Vila Franca do Campo. Foram seus principais dinamizadores, o francês Gerald le Grand e o vila-franquense Duarte Soares Furtado,

(continua)
Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31471, 7 de março de 2018, p. 17)