Pela criação de um Colectivo Açoriano de Ecologistas que tenha por objectivo a reflexão-acção sobre os problemas ambientais, tendo presente que estes são problemas sociais e que a sua resolução não é uma simples questão de mudanças de comportamentos, mas sim uma questão de modelo de sociedade.
sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009
A Fajã do Calhau e a DemocraCIA
GOVERNO DOS AÇORES NÃO INFORMOU CAPITANIA DO PORTO, CÂMARA DA POVOAÇÃO E JUNTA DE FREGUESIA DE ÁGUA : Absolutismo na Fajã do Calhau
As obras do acesso à Fajã do Calhau entre Água Retorta e Faial da Terra, na ilha de São Miguel, continuam a gerar polémica numa altura em que uma comissão do Parlamento dos Açores se prepara para inquirir o governo regional sobre os trâmites que seguiu no processo que levou à opção de abertura de um acesso naquele local (com forte impacto ambiental) e sobre a constante derrapagem dos custos do empreendimento.
Além de ignorar a Capitania do Porto de Ponta Delgada, que é a autoridade que superintende nos Açores sobre o domínio público marítimo, o governo açoriano, eleito pelo PS, avançou com as obras sem dar conhecimento à câmara municipal da Povoação e Junta de Freguesia de Água Retorta, ambas de maioria social-democrata, constatação que levou Francisco Álvares a afirmar que a democracia na Região “está como a bolsa, em queda livre e permanente”.
“Que democracia é esta, que poder regional é este que vive de costas voltadas e que não respeita os outros poderes legitimamente eleitos nos Açores?”, questiona o edil da Povoação.
“O que sabemos é pela comunicação social e pela curiosidade que tivemos de visitar o local quando foi possível porque, agora, ao que nos é dito, o acesso está vedado quer a pessoas quer a transportes”, palavras do edil.
Francisco Álvares diz estar na primeira linha entre os que defendem a construção de um acesso à Fajã do Calhau. A câmara da Povoação, diz, “sempre entendeu que era fundamental que a Fajã do Calhau tivesse um acesso seguro. Até porque há uma ligação histórica e afectiva muito forte entre a população de Água Retorta e a Fajã. Agora, se a questão tivesse sido discutida com a Câmara Municipal da Povoação, possivelmente ter-se-ia evitado os elevadíssimos custos da obra – que acho que ninguém conhece – e tinha-se encontrado uma alternativa muito mais viável e de impacto ambiental menor do que aquela que foi a opção do governo”.
Contudo, como diz o autarca, quando os vários departamentos do governo “iniciam obras na Povoação, ignoram completamente o município. Por isso, a câmara nunca foi dita nem achada nas obras da Fajã e, por isso mesmo, não temos conhecimento mínimo sequer dos procedimentos que levaram à abertura daquela estrada, quer aos meios, motivações, quer tudo o que está envolvido e envolto neste mistério. Sim, porque o que se passa relativamente à Fajã do Calhau é um mistério”, completou.
O presidente da câmara diz estar informado do “inquérito” que o Parlamento dos Açores está a fazer às obras e aconselha: “Esta questão deve ser tratada com toda a exaustão porque todos nós sabemos que andaram dezenas de máquinas dias sem conta na Fajã do Calhau. Os municípios são obrigados, para implementar qualquer obra por mais pequena que seja, a procedimentos legais que todos conhecem. E não faz sentido que uma obra daquela envergadura não tenha a transparência que deve ter”.
Quando questionado sobre se podem estar questões legais em causa, Francisco Álvares responde: “ Não me quero antecipar às conclusões do inquérito que vai, obviamente, acontecer. Mas eu acho que há ali questões complicadas de vária natureza”.
Acentua que o “sentido de absolutismo do governo no conselho da Povoação não é só relativo àquela obra. Põe-se relativamente a todas as obras que o governo tem implementado. Em nenhuma delas o governo consultou ou deu conhecimento à Câmara da Povoação”, conclui.
O presidente da Câmara alerta o jornalista para a necessidade de se perceber de que forma as obras se articulam com o Plano de Ordenamento da Orla Costeira “e com a classificação que a Fajã” neste plano. Aquela é uma zona praticamente ‘não edificandi’, onde não é possível desenvolver construções à excepção de pequeninos anexos (casas de baixo por exemplo), o que contrasta significativamente com uma grande via de acesso àquele lugar”, referiu.
“Que estudos se fizeram e instrumentos se seguiram que permitiram aquela obra. Depois da obra feita, existe. É como as casas que não se construiriam mas que já estão no lugar onde estão. Já lá estão, ninguém as pode tirar…”, ironiza Francisco Álvares.
Levanta também a questão da segurança do futuro acesso. Afirma que a manutenção daquela estrada “vai ser complicada. O seu grau de perigosidade será muito elevado. É uma estrada que fica com falésias extremamente acentuadas, muito elevadas com a possibilidade de desmoronamento e desprendimento de materiais sólidos, pedras e outras coisas assim. O actual acesso, por onde as pessoas se serviram, também tem este perigo. Mas aquela também não o deixará de ter...”, termina.
As obras do acesso à Fajã iniciaram-se também sem o conhecimento da Junta de Freguesia de Água Retorta. O presidente, Baltazar Franco, afirma que “só recebeu informação à ‘posteriori’ numa reunião feita a seu pedido com um director regional”.
Na altura, concordou com o que o director informou? Baltazar Franco foge às questões. “Não vou avançar mais nada. Chegada a hora certa, hei-de dizer alguma coisa sobre aquela obra. Neste momento, não vale a pena fazer perguntas que eu não vou responder”.
Mesmo assim, acabou por dizer que é favorável à construção de acesso à Fajã. Naquele local? “Não lhe vou responder. Não insista”, concluiu.
A Capitania do Porto de Ponta Delgada, autoridade responsável pelo domínio público marítimo, foi igualmente ignorada. “… Não podia chegar ali e dizer: Parem a obra. Isto não está legal e não se pode fazer. Claro que viria logo alguém com mais direito sobre a matéria a questionar: Quem é o senhor para estar a parar esta obra? Que autoridade é que tem?”, questiona Castro Garcia.
Autor: João Paz
Correio dos Açores, 06 Fevereiro 2009