sábado, 10 de dezembro de 2011

A Propósito de Aves



1- A estrelinha ou ferfolha é uma ave granívora?

Uma notícia da Agência Lusa publicada, no Açoriano Oriental, no passado dia 29 de Outubro, e em outros órgãos de comunicação social regionais e nacionais sobre o anúncio, por parte do Governo Regional dos Açores, de um conjunto de medidas para a conservação do habitat da estrelinha-de-Santa-Maria é deveras reveladora do deslize governamental ou da criatividade do(a) jornalista.
Nada tenho contra a substituição das espécies exóticas existentes no Pico Alto por espécies endémicas e acho que tudo deve ser feito para a protecção da estrelinha de Santa Maria, que, de acordo com a versão mais recente do Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal, encontra-se criticamente em perigo, isto é enfrenta um risco de extinção na natureza extremamente elevado.
Mas o que me levou a escrever esta nota foi a divulgação de uma pretensa alteração dos hábitos alimentares da estrelinha.
De acordo com o texto que venho mencionando, o Secretário Regional do Ambiente terá afirmado que a estrelinha é “uma ave granívora, que depende da vegetação natural de grãos, que é muito reduzida na ilha de Santa Maria”.
Foi precisamente esta afirmação que me deixou perplexo, já que sempre ouvi dizer que a estrelinha é uma ave insectívora. Como não sou especialista no assunto, fui consultar tudo o que estava ao meu alcance e não fiquei com quaisquer dúvidas. Com efeito, toda a bibliografia consultada, confirmou que a estrelinha alimenta-se de insectos (Observação de Aves nos Açores, de Pedro Rodrigues e Gerbrand Michielsen) ou mais especificamente de “insectos, vermes minúsculos e aranhas” (Aves dos Açores, de Carlos Pereira).
Nova descoberta científica, erro colossal ou invencionice jornalística?
Também, não fiquei suficientemente esclarecido acerca do que efectivamente se pretende para Santa Maria. Criar um projecto “estrelinha”, à semelhança do Projecto Life Priôlo?

2-Turismo de aviário

Os últimos tempos têm sido pródigos em polémicas a propósito de uma petição lançada por um grupo de ambientalistas, ecologistas, ornitólogos e observadores de aves que pretendem, no essencial, duas coisas: evitar a inclusão de aves nativas dos Açores na lista de espécies cinegéticas e a introdução na região de espécies exóticas para serem caçadas.
A petição, que já seguiu para a Comissão de Assuntos Parlamentares, Ambiente e Trabalho para ser anal e já foi assinada por mais de um milhar de cidadãos nacionais e estrangeiros, terá sido responsável por uma tomada de posição pública por parte da SPEA- Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves.
Embora não me reveja nas posições da SPEA, associação que desenvolve projectos “em conjunto” ou, melhor, financiados pelo Governo Regional dos Açores, considero que foi positiva a sua defesa da “suspensão da caça com munições de chumbo em sistemas aquáticos, a suspensão de caça aos patos, a suspensão de introdução de espécies exóticas e a regulamentação da caça em áreas protegidas e de interesse para turismo de natureza”.
Sobre este assunto, seria de todo o interesse ouvir ou ler a opinião de todas as outras associações que se dizem de ambiente ou, pelo menos, das que se fazem representar no CRADS- Conselho Regional do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável. É que tenho acompanhado, através da página da Assembleia Legislativa Regional dos Açores, a sua nula actividade quanto à emissão de pareceres qualquer que seja o assunto em questão. Se nada têm a dizer sobre nada, não acham que seria um favor que fariam aos cofres da região a sua não presença em reuniões daquele órgão que, na verdade, para pouco serve.
Se para a SPEA parece não haver incompatibilidade entre a morte das aves e a sua observação, para o vice-presidente da Câmara Municipal de Ponta Delgada, os Açores encontraram um novo maná, a observação de aves engaioladas. Com efeito, é dele a seguinte afirmação: “a observação de aves criadas em cativeiro…pode constituir um nicho de mercado turístico nos Açores”.
Quanto ao conceito de biodiversidade do Dr. Bolieiro, nem vale a pena comentar.
Teófilo Braga
Correio dos Açores, 7 de Dezembro de 2011, p. 13)