sábado, 28 de junho de 2008

A Estratégia Energética da Comissão Europeia




por Euan Mearns [*]
Tumultos não baixam preços (Entrada no blog de Andris Pielbalgs, responsável pela DGTREN da UE, em 6 de Junho. Ênfases acrescentadas por mim)
Terça-feira passada fui testemunha de um episódio muito triste. A polícia de tumultos belga empregou a força contra um grupo de pescadores franceses e italianos que marchavam para a sede da UE a fim de protestar violentamente contra os altos preços do combustível. Ocorreu um choque de carros em consequência dos tumultos. A frustração dos manifestantes é fácil de entender, mas certamente manifestações e combates de rua não são a resposta para este problema. Os preços do petróleo estão altos e ficarão mais altos. Nenhuma manifestação pode mudar isto.
No passado, períodos de petróleo bruto relativamente caro foram seguidos por períodos de petróleo barato devido a factores temporários como a primeira Guerra do Golfo. Actualmente, também, há factores temporários que estão a influenciar os preços do petróleo, como o boom no mercado de commodities, a situação geopolítica em várias áreas produtoras, o enfraquecimento do dólar ou a confusão nos mercados financeiros. Contudo, os impulsionadores reais da escalada do preço do petróleo tem uma natureza estrutural. Todos vocês conhecem a lei da oferta e da procura. Se a oferta diminui, os preços aumentam. Se há um crescimento na procura, há também um crescimento no preço. Se, ao mesmo tempo a oferta diminui e a procura aumenta, então os preços disparam. Isto é precisamente o que está a acontecer nos mercados de petróleo.
No ano 2000 a China tinha 4 milhões de carros. Em 2005 já tinha 19 milhões. Espera-se que em 2010 a frota chinesa de carros venha a ser de 55 milhões e 130 milhões em 2020. A Índia está a seguir uma tendência semelhante, e as economias dos Estados Unidos e da Europa continuam a devorar petróleo em grandes quantidades. Cada vez mais pessoas competem por uma commodity cada vez mais escassa. Todos nós sabemos que o petróleo acabará algum dia. A data exacta certamente está em discussão, mas há um facto que ninguém pode negar, extrair petróleo da terra agora é muito mais difícil e caro do que costumava ser.
As fontes fáceis de petróleo já estão a ser utilizada. As companhias petrolíferas actualmente estão a explorar em mares profundos ou em regiões congeladas e inacessíveis. As incertezas geopolíticas reinam nas áreas produtoras de petróleo, ao passo que há uma tendência crescente entre países produtores para nacionalizar os seus recursos, ou tornar mais difícil os investimentos estrangeiros. Há uma escassez crescente de força de trabalho altamente qualificada e a exploração e produção de petróleo está a tornar-se uma actividade de alta tecnologia, extremamente cara.
Todos nós sabemos as consequências. O barril actualmente está em torno dos US$130, 300% mais caros do que há apenas três anos atrás. Peritos estão a falar acerca de preços de US$200 por barril já no próximo ano. A estes níveis, mesmo fontes de petróleo não convencionais, tais como o bruto pesado (heavy crude) ou areias betuminosas, tornam-se atraentes – apesar da sua odiosa pegada de CO2 e do alto consumo de energia.
Então, qual é a solução? Bem, temos de nos mover para longe do petróleo. Isto é o que a Política Energética Europeia está prestes a fazer. Precisamos reduzir a procura com mais transporte, indústria e habitação mais eficiente. Precisamos promover combustíveis alternativos, como biocombustíveis, electricidade ou hidrogénio, precisamos mudar para modos de transporte mais limpos e mais eficientes como comboio, navegação marítima de proximidade, ou transporte público. E nesse meio tempo precisamos continuar nosso diálogo com produtores de petróleo para encorajá-los a produzir mais e abastecer os mercados melhor. Em 24 de Junho irei encontrar-me com ministros dos países da OPEP para discutir com eles esta questão.
A era do petróleo barato e facilmente disponível está ultrapassada. Precisamos mover-nos para longe do ouro negro e incidir os nossos esforços numa economia de baixo carbono. Quanto mais cedo fizermos isso, tanto melhor.

A minha resposta
Caro Andris,
Este texto é a mais assustadora e desordenada das confusões – o que é um reflexo directo da política energética da UE. Há alguns lampejos de luz solar, mas misturados com lixo absoluto.
Todas as vezes que inseri aqui um texto disse-lhe que estamos nas etapas preliminares de uma enorme explosão da crise energética. É uma pena que você tenha esperado até que o petróleo atingisse os US$130 por barril e pelos tumultos dos pescadores franceses antes de perceber que isto é realmente o caso. Naturalmente, se você e a sua equipe estivessem aptos a fazer o seu trabalho, você seria capaz de estudar os dados da oferta e procura publicados pela IEA, a EIA e a BP e concluir antecipadamente que uma crise energética está em andamento e por em acção estratégias efectivas para mitigá-la. Mas não, a sua abordagem é reactiva, bem por trás da curva, com foco errado e sem uma re-elaboração substancial da política de energia da UE, ela está destinada a fracassar. Os tumultos na Bélgica e na Ibéria são em parte por culpa sua. Você é o comissário da UE para a energia, e sonha com tubagens de CO2 enquanto a segurança energética da UE vai por água abaixo.
É encorajador verificar que você finalmente entende que a procura por petróleo, gás e carvão estão em ascensão ao passo que a oferta de petróleo está pelo menos estática. A procura em ascensão contra a oferta estática é controlada pela escalada do preço, encorajando a conservação e pondo os pobres europeus fora do mercado da energia. Nesta altura você deveria entender que quando pessoas pobres têm preços que as põem fora do mercado da energia eles fazem tumultos.
A próxima coisa que você precisa perceber com urgência é que a oferta de petróleo não permanecerá estática por muito tempo. Ela vai reduzir-se um dia, muito em breve (2012 ± 3 anos) . E nessa altura os problemas que estamos a experimentar agora piorarão 100 vezes ou mais. O que é que vai fazer quanto a isto?
A UE e a OCDE em geral não tem absolutamente nenhum controle sobre os abastecimentos global de petróleo. A OPEP sim, mas você tem de entender que a OPEP já está a bombear o mais rapidamente possível. Os dados da IEA mostram que a sua capacidade de reserva está próxima do zero. Assim, o único controle que a OPEP tem seria reduzir a oferta a fim de conservar suas reservas minguantes para futuras gerações.
Portanto, a única parte da equação que a UE pode controlar é a procura. A UE precisa introduzir com alguma urgência medidas para reduzir a procura por petróleo e gás natural [NR 1] . E aqui acredito que você dispõe de algumas boas medidas. Precisamos de planos sólidos e urgentes para transformar radicalmente nossos sistemas de transportes. Para ser directo, viagens aéreas baratas para todos não serão parte deste futuro. Navegação, canais e transito electrificado em massa e carros eléctricos são o futuro. Precisamos alguém com visão para estimular projectos pilotos V2G por toda a Europa.
A conservação da energia e a eficiência energética devem ser as pedras angulares vitais da política de energia da UE. Acredito que entenda isso, mas não parece entender o que significa eficiência energética (portanto você conduz um dos carros menos eficiente em energia alguma vez produzido). Produzir hidrogénio usa mais energia do que a que pode ser recuperada. É um sumidouro de energia, um desperdício de energia e um desperdício de tempo (excepto alguns casos isolados especiais. O etanol consome quase tanta energia quanto ele proporciona e cai na mesma categoria – um desperdício de tempo e de energia preciosa. Você está a converter Ouro (gás natural) em Chumbo (etanol – anedota emprestada de Matt Simmons). Como um guia condutor, se o EROEI de um sistema produtor for menor do que 7, então deve ser ignorado. Ele não produz energia líquida suficiente para fazer andar a sociedade – e assim perseguir as loucuras gémeas do hidrogénio e do etanol não arrastará a Europa para fora do abismo da energia líquida
Em suma, o que você fez com esta entrada no seu blog foi reempacotar toda a errática política energética da UE que baseada sobre alterações climáticas e redução das emissões de CO2. Tentar agora vender este lixo como solução para a crise de energia emergente é insultuoso.
A partir daqui há dois caminhos para a frente. Das duas uma: você tem de admitir que a actual política energética é uma confusão caótica, lacrimeja e começa tudo outra vez – mas isto precisa ser feito com urgência, numa questão de meses. Ou então você deve demitir-se e deixar alguma outra pessoa efectuar esta tarefa vital.
PS: Apoio totalmente o comentário aqui inserido – se quiser reduzir a procura de petróleo hoje precisamos de limites de velocidade pan-europeus e legislação sobre [os carros] beberrões de gasolina. Deixemos que os bons engenheiros alemães voltem a sua atenção para a eficiência ao invés da velocidade e da potência.
[NR 1] Ao contrário do petróleo, o gás natural pode ter uma origem não fóssil: pode-se produzir biometano (sem que haja competição com produtos alimentares). Portanto, os veículos a gás natural são também uma alternativa eficaz e sustentável.
13/Junho/2008
[*] Bachelor of Science, PhD, Editor de The Oil Drum Europe .
O original encontra-se em http://europe.theoildrum.com/node/4147
Este artigo encontra-se em http://resistir.info//.