sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

ECOLOGIA SOCIAL VERSUS ECOLOGIA LIBERAL

A ecologia é a ciência das trocas e dos equilíbrios naturais, isto é, ciência que trata das relações entre os seres vivos, plantas e animais, e entre estes e o seu meio e habitat.

Ao lado desta ecologia natural, pertencente ao domínio das ciências da natureza, juntamente com a biologia e a geografia física, desenvolveu-se, entretanto, a partir daquela uma ecologia politica que estuda o impacto das actividades humanas, nomeadamente as de carácter económico e produtivo, sobre aqueles equilíbrios naturais. Pela sua abordagem específica da realidade envolvente, a ecologia mantém uma relação conflitual com a tradicional ciência económica, vista as mais das vezes como um verdadeira ideologia dominante da civilização industrial, mercantil e produtivista do capitalismo.

A ecologia política deu origem, desde os anos 60/70 do século XX, a um crescente e cada vez mais poderoso movimento social, o ecologismo, cujo objectivo é mudar a forma como se produz e como se consome a fim de preservar o ambiente natural.

Dentro do ecologismo podemos encontrar várias teorias/doutrinas ecologistas, todas reclamando a necessidade de defender o ambiente natural.

No plano filosófico há fundamentalmente uma oposição entre uma ecologia antropocêntrica, que coloca o homem no centro do seu concepção, e uma ecologia biocêntrica, que preconiza um descentramento daquela visão de molde a envolver todos os seres vivos, não só os seres humanos como também os animais e as plantas.

No plano económico diferenciam-se duas concepções contrárias: a ecologia liberal e a ecologia social.

A ecologia liberal lança os seus fundamentos nos mecanismos do mercado e acredita que através de uma legislação normativa apropriada será possível resolver os problemas ambientais que afectam as sociedades contemporâneas. Na linha desta visão ambientalista, os seus representantes defendem a chamada internalização dos custos (e prejuízos infligidos à natureza) através do cálculo económico e contabilístico das empresas e das famílias ( com a consequente criação de taxas e de subsídios, tal como acontece para com qualquer outra actividade económica ), a promoção da investigação e da inovação técnica ( para se obter técnicas produtivas limpas, como os carros não-contaminantes, etc), assim como o desenvolvimento do denominado capitalismo verde (eco-business, eco-indústrias, etc, etc) que permitirão gerir economicamente os recursos da natureza, sem causarem grande impacto sobre as grandezas macro-económicas como o PIB, o emprego e o crescimento económico. No fundo, a ecologia liberal pretende substituir o capital natural pelo capital técnico como único meio para garantir as capacidades produtivas das gerações futuras.

A ecologia social não tem uma visão economicista dos problemas ambientais, considerando mesmo que a própria economia se tornou com o neo-liberalismo num instrumento de mistificação e legitimação de um sistema sócio-económico depredatório e suicidário, para além de se ter mostrado profundamente iníquo.

Sob a designação geral de ecologia social, originariamente associada a Murray Bookchin, encontram-se no entanto vários autores (Lewis Mumford, J.Ellul, I.Illich, A. Gorz, etc.) e abordagens que questionam o capitalismo, a ideologia produtivista, a sociedade de consumo e de desperdício, assim como as desigualdades sociais, o racismo e o domínio e a exploração de uns homens sobre os outros, abordagens estas que se complementam e que preconizam um novo paradigma (modelo) social e uma nova forma de relacionamento para com a natureza.

Para estes autores a técnicas produtivas da indústria capitalista ao procurarem satisfazer uma necessidade, através da produção industrial das mercadorias, geram outras tantas carências e insatisfações que, num ciclo interminável, aguardam pela sua superação. O crescimento económico, segundo estes autores, alimenta-se dos seus próprios prejuízos e insatisfações que produz incessantemente. A conclusão é, pois, óbvia: a economia tal como a conhecemos, isto é, a economia capitalista é contra-produtiva, já que o crescimento se mostra nefasto, lesivo e ilusório. Nefasto, porque destrói os recursos não renováveis e gere, além disso, altíssimos custos sociais: exclusão, precariedade, desemprego tecnológico, alienação social e mercantil, perda do sentido e de autonomia face às forças poderosas do Estado e das grandes mega-corporações, as empresas transnacionais. Ilusório, porque não existe na realidade valor acrescentado senão por via dos preços, e estes não dão conta das inutilidades crescentes (desperdícios,etc) e dos valores perdidos.

Claro está que um questionamento do progresso e do crescimento económico deste género arrasta consigo outros problemas, como o problema do emprego e a indispensabilidade de um outro modelo e de uma outra lógica que não seja o produtivismo economicista de inspiração liberal ( ou marxista) da economia clássica, predominante desde a Revolução Industrial. Uma vez que não haverá empregos para todos haverá então que dividir os rendimentos gerados ( consultar a esse propósito André Gorz) e redefinir o papel do Estado e do mercado, bem como da esfera das actividades autónomas (triângulo de S.C. Kolm).

Nesta perspectiva valorizam-se as actividades autónomas, fora do âmbito do mercado, que são conviviais, que se mostram pouco poluentes , porque utilizam técnicas produtivas alternativas, e são promotoras do salário mínimo universal, o qual deverá ser acrescentado ao elenco já tradicional dos direitos do homem, e como tal qualificado.

O controle das chamadas tecnociências, até agora submetidas aos imperativos económicos do lucro ou do poder ( consultar sobre a matéria L.Mumford, J.Ellul), integram todo um projecto alternativo que valoriza as sinergias comunitárias de cooperação e entre-ajuda, e contesta frontalmente o capitalismo e o seu pretenso realismo em resolver a crise ambiental, cujo desencadeamento e agravamento ele próprio foi o principal responsável.

A ecologia social aponta claramente para a superação do paradigma modernista da ideia de «progresso» e de «crescimento», cujos limites são cada vez mais patentes com o rápido esgotamento dos recursos naturais, remetendo para aquilo que já é designado por alguns como sociedades do pós-crescimento.
(retirado de Pimenta Negra)