quarta-feira, 29 de outubro de 2014

A propósito de invasoras



A propósito de espécies invasoras

Muitos açorianos continuam alheados das questões ambientais e continuam a dar pouca ou nenhuma importância à conservação da natureza.
Estamos longe do período áureo da educação ambiental promovida pelos serviços oficiais que era implementada pela rede regional de ecotecas, geridas por associações diversas, com atividades destinadas a jovens em idade escolar e não só e que culminava com a realização anual de um Encontro Regional de Educação Ambiental.
Hoje, a educação ambiental está quase e tão só restrita ao Programa Eco-escolas que cada vez mais mobiliza menos professores e cujas atividades quando existem atraem cada vez menos alunos. Além disso, pelo menos nos casos que conheço bem, caiu-se na rotina da participação nos desafios lançados a nível nacional, como concursos de árvores de natal, e os eventuais efeitos positivos do projeto não se estendem a toda a comunidade escolar.
As autarquias pouco fazem e quando o fazem é quase apenas para cumprir calendário. A título de exemplo, menciona-se os dias sem carros, em que como alternativa aos mesmos se apresentam póneis ou trotinetes, os dias da árvore, com plantações de endémicas em cima umas das outras, ou os dias do ambiente com a construção de ninhos para aves em zonas urbanas e que, na melhor das hipóteses não servirão para nada, e. na pior, irão ser muito úteis aos pardais que não são uma espécie que merece medidas especiais de proteção, antes pelo contrário.
Mas, para além do que está escrito acima, a grande falha de toda a tentativa de educação ambiental está no ignorar que os problemas ambientais são problemas sociais e que só podem ser resolvidos se houver alterações profundas nas sociedades atuais.
Não é de agora o fenómeno das espécies invasoras, que existe desde sempre mas que ter-se-á intensificado, a partir do século XV, com os descobrimentos. No caso dos Açores, desde o seu descobrimento têm sido introduzidas, voluntariamente ou não, várias espécies que cá se têm adaptado. Algumas têm sido de grande utilidade para quem cá vive, enquanto outras, pelo contrário, tornaram-se numa das principais ameaças à conservação da flora e fauna endémicas.
Nalguns meios, mais restritos, há quem esteja à procura de responsáveis pelas espécies introduzidas que se transformaram em invasoras e o nome mais apontado tem sido o de José do Canto, que como todos sabemos terá sido o açoriano que mais espécies vegetais, oriundas de várias regiões do planeta, terá introduzido e cultivado nas suas propriedades.
Não querendo alijar responsabilidades a ninguém, considero de algum modo injusta a procura de bodes expiatórios e sem sentido o culpabilizar quem viveu noutra época, onde as preocupações eram outras e não se tinham os conhecimentos que hoje se têm. Com efeito, José do Canto, ao introduzir muitas espécies, tinha objetivos bastante definidos que estavam relacionados com o aproveitamento das mesmas para a agricultura, a horticultura, a silvicultura e a ornamentação de jardins, tornando possível uma melhoria da qualidade de vida de quem cá vivia.
Também, embora não querendo crucificar ninguém, é importante ficar registado que, depois de se ter conhecimento de que algumas introduções causam desequilíbrios nos ecossistemas, podendo levar à perda da biodiversidade e à extinção de espécies nativas, é no mínimo negligente continuar com introduções de espécies que noutras regiões têm um comportamento invasor.
A título de exemplo de introduções negligentes, recordo-me a plantação de lantana nos “socalcos” do aeroporto de Ponta Delgada, importadas do continente, quando por cá já andavam a conspurcar alguns locais da ilha de São Miguel ou a tentativa de introdução de Ipil-ipil, para a produção de biomassa para alimentar uma futura central produtora de energia elétrica, que chegamos a ver nos viveiros dos Serviços Florestais nas Furnas.
Mais recentemente, regista-se o caso da plantação de erva-confeiteira nas Portas do Mar ou do penacho ao longo das estradas. Esta última planta, apesar de muito bonita, é invasora em várias zonas do mundo e já está a mostrar os seus dotes em terrenos incultos da ilha de São Miguel, destacando-se os situados na zona do Caldeirão.
Teófilo Braga
(Correio dos Açores nº 30473, 29 de Outubro de 2014, p.10)