Pela criação de um Colectivo Açoriano de Ecologistas que tenha por objectivo a reflexão-acção sobre os problemas ambientais, tendo presente que estes são problemas sociais e que a sua resolução não é uma simples questão de mudanças de comportamentos, mas sim uma questão de modelo de sociedade.
quinta-feira, 10 de janeiro de 2013
Maravilhar-se com Rachel Carson
Maravilhar-se com Rachel Carson
No final do ano passado, como forma de celebrar o quinquagésimo aniversário da publicação da primeira edição do livro “Primavera Silenciosa” (Silent Spring) e simultaneamente o quinquagésimo aniversário do movimento ecológico moderno, a associação portuense Campo Aberto e as Edições Sempre em Pé editaram o pequeno livro de Rachael Carson, “Maravilhar-se: reaproximar a criança da natureza” (The Sense of Wonder).
Com um texto excecional, o livro “Maravilhar-se: reaproximar a criança da natureza” possui fotografias, onde a paisagem dos Açores está presente, de onze fotógrafos, quatro dos quais residem em Ponta Delgada, sendo dois deles naturais dos Açores.
A grande lição deste livro, apoiado pelo Programa Gulbenkian Ambiente, que merecia uma maior divulgação entre nós, é a de que “ para que uma criança mantenha vivo o seu sentido inato do que é maravilhoso sem que lhe tenha sido dado tal presente pelas fadas, ela necessita um adulto com quem possa partilhá-lo, redescobrindo com ele a alegria, o entusiasmo e o mistério do mundo em que vivemos”.
Maior divulgação, e mais do que isso uma leitura atenta por todos os adultos, merecia ter o clássico do pensamento ecológico “Primavera Silenciosa”, numa altura em que, a par dos benefícios da indústria química para a sociedade, existe uma falta de segurança para o consumo pois, como muito bem escreveu Lúcia Fernandes, na revista Ar Livre nº 21, o crescimento da referida indústria “ não foi acompanhado de uma maior regulação e de melhor precaução”.
No seu livro “Primavera Silênciosa”, Raquel Carson denunciou a presença do DDT (sigla de Dicloro-Difenil-Tricloroetano), um inseticida barato e altamente eficiente, nas cadeias alimentares e a sua acumulação nos tecidos dos animais e do homem, podendo originar cancros. Carson, também, “mostrou que uma única aplicação de DDT, numa exploração agrícola, matava insetos durante semanas e meses e, não só atingia as pragas, mas um número incontável de outras espécies, permanecendo tóxico no ambiente mesmo após a sua diluição pela chuva”.
A sua denúncia não foi bem aceite por toda a sociedade, alguns altos funcionários e algumas indústrias químicas, curiosamente algumas das mesmas que hoje apresentam os OGM como uma alternativa ao uso de pesticidas, participaram numa vil campanha de difamação da autora. Na altura, para além de ter sofrido ameaças judiciais, a sua integridade foi ridicularizada, tendo sido mesmo considerada “histérica” e o livro foi acusado, e ainda hoje o é, de apresentar “visões alarmistas” e de ser uma “mistura híbrida de ciência e ficção “.
Apesar de tudo, Rachel Carson não baixou os braços o que fez com que o Presidente John F. Kennedy e o Congresso tenham respondido positivamente à sua denúncia, tendo daí resultado a criação de legislação que proibiu alguns inseticidas e que levou à redução do uso de outros ou ao seu condicionamento.
O livro “Primavera Silenciosa” teve um impacto enorme junto do cidadão comum pois Rachel Carson foi capaz de redigir uma obra que era simultaneamente de investigação e de divulgação, tendo-o escrito “num estilo claro e simples, mas literáriamente irrepreensível e mesmo atraente”.
Raquel Carson, com a sua obra, deu um contributo importantíssimo à consciencialização do público para a vulnerabilidade da natureza face à intervenção humana, fez com que crescesse o número de pessoas que passou a preocupar-se com os problemas da conservação da natureza e com a extinção de espécies.
O livro “Primavera Silenciosa” segundo Edward O. Wilson., conhecido biólogo americano, “aplicou um choque galvânico na consciência pública e, como resultado, infundiu ao movimento ambientalista uma nova substância e significado”.
Mais do que os perigos do DDT, terá sido o questionar a confiança cega no progresso científico e tecnológico que terá causado a maior polémica.
Hoje, o movimento ambientalista parece que nada aprendeu!
Teófilo Braga
(Correio dos Açores, nº 27324, 10 de Janeiro de 2013, p.19)